sábado, 30 de abril de 2011

O desafio do longo prazo

I
O nosso desporto trata das questões em compartimentos estanques no curto prazo e sem uma perspectiva de sustentabilidade de longo prazo.

A discussão económica em Portugal e no mundo é efervescente publicamente e trata das questões do médio e principalmente do longo prazo.

A sustentabilidade do crescimento económico é a proposta do FMI, enquanto o BCE prefere a sustentabilidade de um quadro de racionalidade económica com défices baixos pretendendo castigar os países que não conseguem essas metas.

Simultaneamente não pretendem usar a solidariedade perante o impacto das medidas que aplicadas a economias mais desenvolvidas geram falhas de mercado em economias menos desenvolvidas como a portuguesa durante a criação do euro e que obrigou ao aumento dos custos monetários da periferia.

II
Esta explicação económica ajuda a iluminar os erros e o atraso em que sobrevivem as federações desportivas dependentes do Estado para um produto único, o alto rendimento, de complexidade elevada na ausência de uma estrutura de mercado privado alavancada por políticas públicas orientadas para a base da pirâmide e acumuladas durante décadas.

O Modelo Europeu de Desporto tem sucesso porque investiu durante mais de meio século em desporto para todos e desencadeou medidas de especialização da sua prática desportiva de forma racional em todos os níveis de produção da pirâmide de produção de desporto.

III
O discurso dos líderes desportivos nacionais inexiste porque a única coisa que sabem fazer é exigirem meios directos e indirectos para o seu alto rendimento.

Os líderes desportivos não discutem medidas de longo prazo e das consequências directas e indirectas das políticas desenvolvidas.

Ficam contentes com o seu evento, com o seu CAR, com o apoio à sua acção de formação, range os dentes porque lhes é cortado o financiamento público, corta na sua actividade desportiva porque o Estado não cumpriu a sua obrigação, o que o Estado também aceita porque o objecto da política não é a maximização do produto desportivo em toda a sua latitude.

Cala-se. Está agradecido porque consegue pagar os compromissos directos da sua organização e de todos que dele dependem. Agradece aos que compreensivelmente aceitam o atraso nos pagamentos.

Sabe que ninguém lhe vai pedir para cumprir metas desportivas e sabe que também não deve fazer perguntas sobre o que se passa com o financiamento público desportivo, o que vai acontecer aos estádios, aos CAR’s e como vai ter mais praticantes.

Não lhe passa pela cabeça perguntar porque é que ele não é financiado pelos resultados conseguidos.

Teme perguntar porque é que ele que foi eficiente em certos vectores, tem cortes no financiamento e outros que estagnam há décadas mantém níveis de financiamento.

Sabe que existem estatísticas e estudos que lhe são favoráveis mas prefere não fazer alarde delas e trata-as para obter margens que lhe parecem douradas. Dizer-lhe que essas margens são ilusórias tem como resposta que “é o possível, meu bom amigo!”.

O líder desportivo nacional sabe que o apoio que recebe da sua federação europeia e da mundial depende de resultados em que ele se compromete e não pensa de forma nenhuma faltar aos compromissos que assume.

Ele vê as eleições como a continuação do espírito da ‘Lei de Bases do Sistema Desportivo’ de 1990 e que os programas partidários já começam a reiterar o seu propósito supremo, como sempre foi feito.

Espera que os novos líderes do desporto do novo governo mantenham as valências anteriores consubstanciadas nas caras que representam os ‘bons valores’ do desporto português.


IV
Algumas destas coisas vão acontecer certamente e misturadas com algumas certezas.

A capacidade do desporto português reagir ao novo quadro institucional e económico é frágil.

As federações vão defender a ‘obtenção do subsídio do trimestre passado’ porque lhe vão dizer que não vai haver ‘espaço para milagres’ face à situação do país e o desporto ‘é um sector como os outros’ e ‘tem culpas na bancarrota do país com os estádios do Euro2004’ e os ‘apitos’ demonstram que o desporto tem áreas de corrupção.

O FMI, o BCE e a União Europeia vão avançar com medidas que estão para além da compreensão das federações e estas vão dizer que ‘assim, não se pode trabalhar’.

Terão inteira razão.

Interessante do ponto de vista da análise, política, económica e social, será observar quanto tempo vão as federações desportivas nacionais compreender que o modelo de produção das Leis de Bases soberanas e do Euro2004 morreu e que o país está a acelerar a sua divergência com a Europa.

Os presidentes do Benfica, do Braga e do Porto vão dizer que nunca o mundo português brilhou tanto.

E, contudo, Portugal afasta-se na União Europeia do desporto.

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