domingo, 29 de maio de 2011

Eficiência económica, externalidades desportivas e política pública

Quando observamos um mercado que gera um produto de 9 mil milhões de euros em 6 anos devemos ter em atenção os objectivos que se procuram maximizar com o seu produto.


Sendo os recursos escassos a primeira pergunta é se os recursos colocados à disposição pela sociedade atingem os objectivos com eficiência. Sumariamente será a de obter o máximo de produto com o mínimo de despesa.

É isso que fazemos quando vamos ao mercado e trazemos um cabaz de compras que obtivemos comprando os produtos que mais nos agradavam pelo preço mais baixo. Para isso negociámos com os vendedores, perguntando os preços, comparando a qualidade e decidindo por uma compra.

Se um governo tem o potencial de 70 milhões de euros para investir no desporto por ano ou de 420 milhões de euros por parte de uma das suas agências e de 1,8 mil milhões por parte das autarquias estes são montantes muito elevados e que exigem desde início da governação a afirmação dos objectivos do investimento.

Ao trabalhar com políticas de desporto sem ter uma preocupação de eficiência económica pode acontecer que o investimento realizado seja ineficiente ou mau por vários motivos:

1. se se fazem infra-estruturas sem uso, como parte dos estádios do Euro2004 fica-se à mercê dos 'opinion-makers' atacam todo o projecto quando existe um erro com as infra-estruturas bem claro
2. outro tipo de erros é a predominância das preferências dos agentes públicos que impõem soluções desajustadas, erradas, porque desconhecem de facto como agem os produtores desportivos ou como se deve produzir desporto com eficiência
3. os agentes públicos também erram quando beneficiam agentes pontuais em prejuízo da sociedade e da população em geral
4. o processo de negociação no mercado é susceptível de ser apropriado pelos agentes mais activos
5. os direitos de propriedade não sendo bem definidos geram situações de ineficiência

Existem outros problemas mas vamos fixar apenas estes como demonstrativos que o produto do mercado desportivo pode não ser eficientemente maximizado pela acção do Estado.


Outra razão da ineficiência do mercado é a produção de externalidades que são benefícios que terceiros se apropriam sem terem feito parte da transacção de mercado que gerou esse benefício.

O exemplo mais comum é o dos benefícios da saúde que aumentam a produtividade dos cidadãos e trabalhadores e que a economia como um todo beneficia mas quem paga a transacção privada é o seu consumidor.


Estamos portanto perante duas acções possíveis do Estado ou de política pública desportiva:

1. Assegurar a eficiência da produção e da transacção de desporto cuja dimensão deverá procurar alcançar a totalidade da população

2. Internalizar os benefícios externos apropriados pela sociedade e pela economia graças à produção desportiva eficiente

Então e a democracia do funcionamento das organizações desportivas? perguntam algumas pessoas. As federações são corruptas! acrescentam logo de seguida.

A aplicação dos princípios sejam os constitucionais, sejam os olímpicos dão aos agentes desportivos e ao Estado instrumentos que aplicados ao mercado lhes permitem trabalhar melhor e alcançar um maior produto desportivo, no caso concreto deste sector. A literatura científica demonstra que as sociedades com melhores instituições e menor corrupção produzem um maior produto desportivo em cada um dos seus segmentos sejam o informal, a recreação formal e o alto rendimento.


Conclusão


Face ao nível frágil de produto desportivo nacional é plausível que haja aspectos relacionados com a falta de democracia e de eficiência no seio das organizações privadas e no funcionamento das instituições públicas associadas ao desporto.

A eficiência económica é um instrumento útil ao desporto quando a economia está bem e para a resolução do que está mal a eficiência é ainda mais útil, porque aconselha a investir melhor para resolver os problemas existentes.

Na actual situação desportiva nacional em que os recursos se vão tornar ainda mais escassos, com as medidas de austeridade da troika, conviria ao desporto atentar à boa aplicação dos seus recursos escassos e a conseguir também internalizar as externalidades que vai gerando para a sociedade.

Este exercício para o Governo de maioria é também relevante porque existem desafios a transformar tanto na regulação privada no seio do associativismo desportivo, como com as empresas produtoras de desporto, como nas organizações públicas que trabalham e que regulam o mercado do desporto.

6 comentários:

JCN disse...

"e um governo tem o potencial de 70 milhões de euros para investir no desporto por ano ou de 420 milhões de euros por parte de uma das suas agências e de 1,8 mil milhões por parte das autarquias estes são montantes muito elevados e que exigem desde início da governação a afirmação dos objectivos do investimento."

Sou um estudioso da eficiencia desportiva, numa perspectiva de políticas públicas, e gostaria de o questionar quanto a esses números. !,8 mil milhões nas autarquias? esses dados estão longe de coincidir com alguns dados públicos, pelo menos a que tenho acesso.

Fernando Tenreiro disse...

Então e quais são os dados que tem?
Se multiplicar 300 milhões de euros redondos das autarquias por seis obtém 1,8 mil milhões.
O investimento das autarquias poderá ser ainda maior.
Estes valores são apenas para nos aprecebermos da ordem de grandeza em causa.
Como é muito dinheiro, a análise da eficiência económica é decisiva.

JCN disse...

esqueça, estava a falar dos 6 anos(saltei essa parte na leitura)..."eu" tenho valor mais elevados para as autarquias, a rondar os 350M ( INE/PORDATA ), presumo que a fonte seja a mesma.

Fernando Tenreiro disse...

faz bem em usar os dados para compreender a situação desportiva.

por este motivo é que os dados e as situações devem ser relativizadas

se multiplicarmos 50 milhões de euros por 6 anos são mais 300 milhões mostrando que as autarquias terão ultrapassado os 2 mil milhões.

É muito dinheiro e podem fazer-se muitas coisas e levar o desporto à falência também

Esta era a discussão útil

diga de sua justiça, quando lhe aprouver

JCN disse...

A discussão sobre o sucesso de uma coisa deve prender-se, sempre, com o objectivo a que nos propomos. Objectivos que não sejam mensuráveis são, na minha opinião, fúteis. Vejo, e leio, uma grande discussão em torno do desporto e, no fundo, só me resta dizer que todos os cêntimos gastos são em demasia, parece cruel mas é verdade.

(O nosso desporto faz-me lembrar um grupo de amigos que sai à rua sem saber para onde se dirige mas que continua caminhando enquanto decide, correndo o risco de se estar a afastar do seu objectivo)

Como podemos pedir, para o desporto, mais recursos se não temos objectivos e estratégias claras? Se o desporto tem uma conotação de batota e trafulhice(será esta a sua relação umbilical com a política?)?

Mais, como podemos querer ter sucesso, utilizando sempre os mesmos pressupostos e com cópias integrais dos modelos de alta competição de outros países? como é que é possível termos um estado a pagar para existir regulação(Federações), pagar para existir oferta(clubes) e ainda, veja-se bem, criar oferta(escolas)?

Os tais 350M de euros não incluem os custos que algumas autarquias, encarregues de celebrar contratos para AEC’s, suportam na promoção do desporto. Nem tão pouco o custo do desporto escolar. Não me admirava que estivéssemos a olhar para um número próximo ou superior aos 400M.

Com os 400M (autarquias + IDP) podíamos e devíamos ter um desporto muito mais capaz. Podíamos ter muito mais praticantes informais e fomentando este mercado não necessitávamos(nós - estado) de pagar o desporto privado.

Fernando Tenreiro disse...

É de facto muito dinheiro mas o mais importante é como sugere os princípios e as políticas.

Há uma lacuna tremenda relacionada com os estudos e análises.

Não é possível assumir princípios e políticas sem uma percepção das disponibilidade financeiras e materiais.

Descoonhecem-se as infra-estruturas, os níveis de prática e quem produz o quê.

Mas veja que os nossos amigos de todos os partidos que trabalham no desporto são úteis e prestáveis e todos trabalham em sintonia.

Há uma incapacidade de gerar um novo discurso e mais ainda de acordar alternativas às políticas de desporto vigentes.

Veja o meu próximo poste sobre o impacto das medidas de austeridade.


grato pelos comentários